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A visão comercial dos clubes por um profissional – entrevista

O desejo de muitas pessoas apaixonadas pelo esporte é trabalhar com esporte. Dentre as muitas características que estamos acostumados a lidar no dia a dia, é notar como os profissionais estão executando suas funções. Hoje, mais além, notamos também como esses profissionais estão se capacitando.

O Ataque conversou com André Maakaroun, gestor comercial por duas agências de marketing esportivo. A primeira experiência foi com a ACE – Administração e Consultoria em Esportes e Eventos e, posteriormente foi convidado a trabalhar na Serápis Bey Sports & Marketing.

Durante a conversa, André nos passou sua experiência pelo mercado, sua visão de negócios e como ele encara o atual panorama do marketing esportivo. Vejam as perguntas que fizemos para ele e esperamos que tenham muito a absorver dessa conversa:

 

Apresentando, André Makaaroun.

André, fale sobre sua trajetória no marketing esportivo e explique pra gente a função do setor comercial dentro deste nicho.

Trabalhei com marketing esportivo em 2 empresas: a ACE e a SB Sports (Serápis Bey Sports). Nas duas empresas, trabalhei na área comercial, com captação e patrocínio para os clubes e eventos do esporte. Na Ace, cuidamos do marketing do América Mineiro, que estava na terceira divisão e terceiramos o setor de marketing do clube por alguns anos. Fomos atrás de patrocínio, eventos e comemoramos o centenário do clube, sempre procurando verba para viabilizar o funcionamento. Vendas de placas, comercialização de exibição de patrocínio na camisa. Criamos alguns eventos como a “feijoada” e a “Blitz”. Quando o clube subiu da série B para a série A em 2010, fizemos várias premiações em bar com brindes. Os bares ficavam cheios.

Como a torcida tinha poucas ações, a gente conseguia envolver o torcedor. Desenvolvemos ainda o sócio torcedor conhecido como Onda Verde, com vários planos e o lançamos. Trabalhamos com várias frentes: Sócio, patrocínio, ativações. O grande barato é que conseguíamos comercializar tudo que pudéssemos. O clube não é só camisa, não é só placa. Conseguimos fazer algo inédito: personalizamos o banco de reservas com a Herbalife. Toda vez que era focado o banco, a marca da empresa estava lá, não necessariamente na camisa, como tradicional para o torcedor. Íamos aonde a marca queria atingir o seu público, usando o futebol como visibilidade. Durante 3 a 4 anos, fomos a agencia do BMG, grande investidor do esporte. Futebol, vôlei, piloto, atleta de MMA entre outros estavam no cast. Todo patrocínio fechado, a gente fazia ativação. Para entender: quando há o patrocínio é bacana ativar, não só colocar a marca. Fazer ações, sorteando brindes, interagir com todos, chamar as promotoras para comparecer ao estádio. Sugiro que uma empresa quando vá patrocinar o clube, que ela tenha uma verba a mais para movimentar e se empenhe na busca de alcançar o público.

Fiz ainda a meia maratona da Pampulha, campeonato mineiro de vôlei sendo pela primeira vez transmitido pela TV.
Na Serápis, atuei com vários clubes. Cruzeiro, Atlético, Villa Nova, Boa Esporte, Caldense. Captamos patrocínio e vendemos placas de publicidade para clubes. Alguns clubes de menor estrutura não tem um departamento pronto e geralmente eles nos procuravam. Negociamos por diversas vezes patrocínio pontual. Fizemos a entrada de várias marcas no futebol. A Tenco, que não tinha investimentos no esporte, entrou no Atlético e permaneceu.
Fazia relatórios de aparição nas transmissões, o patrocínio depende dessa visibilidade e aparecer em jogos, e ainda tinha a repercussão, nos gols dos programas esportivos, melhores momentos, etc.

Vamos às perguntas:

1 – André, você gostava do seu trabalho? Era desafiador? Quais os obstáculos você encontrou dentro do mercado?

É um trabalho maravilhoso. Você mexe com esportes, eventos, com clubes. Quando você fecha algo para o clube você colabora para ele melhorar. É um trabalho que você tem que prospectar empresas parceiras. É bacana quando se apresenta um projeto, apresenta um clube para uma empresa que nunca investiu no esporte e aquilo que tem para oferecer, qual é o retorno, qual audiência, qual contrapartida ele terá.

Não acho que tenha tanta pressão. No comercial não tem tanta pressão assim. O prazo é algo que nos pressiona, para confeccionar e mostrar para a torcida, mas fora isso, não me lembro de nenhuma situação de pressão. Mas com parceiros certos para confeccionar placas, silks de patrocínio nas camisas você cumpre prazos e fica tudo bem. É muito desafiador, sem dúvida.

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André Maakaroun é gestor comercial e trabalhou em duas agências de marketing esportivo por anos.

2 – Quais os principais desafios o departamento comercial e de captação de patrocínio enfrentam no cenário econômico atual?

Como tudo no país, o esporte também foi atingido pela crise. Se a empresa começa a ter dificuldade, demitindo, fechando filiais, uma das coisas que ela vai fazer é cortar investimento em marketing. Mesmo ela tendo convicção que é uma área importante. Mas ocorre uma avaliação. Em geral, tudo é concorrente: jornal, rádio, televisão, tudo vira concorrência. A empresa as vezes pode optar por registrar a marca dele numa propaganda na TV do que investir e colocar a marca numa placa estática de campo.

Pesa-se muito. O importante é ter convicção, acreditar naquilo que você faz ter um produto bom e ter entusiasmo, mostrar que quebrar paradigmas é importante. O retorno no esporte é muito bom, é preciso mostrar isso. Todo o esporte tem uma visibilidade muito grande por aqui. Acabamos de sediar uma Copa e uma Olimpíada. Pena que estamos enfrentando um momento difícil, mas isso é para todas as áreas. Acho que mais do que nunca temos que trabalhar com criatividade e convicção e continuar acreditando. Negociar melhor com os clubes, mostrando vantagens e benefícios que possam ter. Algumas vezes, as marcas e clubes não tem essa ideia. Clubes não sabem desse potencial, muitos são despreparados, eles não sabem.

3 – Você conquistou credibilidade no mercado pelas qualidades em negociação. Tem alguma técnica para negociar em especial?

Quando vamos levar um produto ou propriedade do clube, temos que estar convictos do que estamos oferecendo. É fundamental. Tudo é investimento e resultado. Se eu investir 1 real em algo eu quero saber o que vou ganhar em troca. O empresário pode achar bonito e até ser torcedor do clube, mas ele que saber o que vai ter de retorno. Já tivemos empresário torcedor de time X que investiu em outro time. Ele achou que o investimento daria resultado naquele momento no determinado clube. Independente do time dele de coração ele quer investir em algo que dê retorno e visibilidade e que a marca dele vá aparecer.

É preciso mostrar para ele o resultado: audiência, quantas pessoas estarão lá, previsão e qual tipo de público, se o evento é popular, e se o produto dele é de poder aquisitivo maior, ele precisa rever o investimento. Anunciar o produto em um time de grande rivalidade, pode não ser satisfatório, porque o torcedor adversário pode rejeitar. O torcedor cobra de um clube quando ele está sem patrocínio. Parece que o clube está desvalorizado. Quando um Santos está sem patrocínio, mesmo com uma camisa tão bonita, em geral o que transmite é que o clube está desvalorizado. Empresas podem ver que os clubes estão valorizados com marcas.

Quando for vender qualquer coisa, você tem que saber o tamanho do clube, do evento, saber a história do clube e da torcida. Uma dica pessoal: conhecer bem o que está vendendo, ter boa abordagem e boa comunicação, material auxiliar é uma boa também (notebook e/ou proposta por escrito, para dar credibilidade), entender a empresa e a necessidade dela. Se você tiver levando uma proposta para uma empresa que não tenha nada a ver com o alvo que você está oferecendo, eles podem até achar bonito, mas ele NÃO vai fechar. Você tem que pesquisar. Fechamento é você saber se o “olho dele vai brilhar” pelo custo benefício da coisa. Mostrar empresas que já investiram e nunca mais saíram do esporte.

4 – O que você acha do panorama dos clubes hoje e dos departamentos comerciais? E o que você acha do empresariado em geral apoiando o esporte?

Os clubes no seu modo geral não estão muito preparados. Nas duas empresas que trabalhei buscávamos produtos dos clubes para vendê-los. Em clubes menores eles não sabiam mensurar o valor que poderiam oferecer – na camisa, por exemplo. Eles não tinham profissionais para mensurar isso. Por exemplo, em jogos da copa do brasil, times menores iam enfrentar times grandes pela competição e víamos ali uma oportunidade de um patrocínio pontual, já que o jogo seria transmitido pela TV. Muitas vezes, os clubes pequenos sequer cumpriam o prazo de entrega da proposta. E isso faz perder a credibilidade. O empresariado que entra pela primeira vez e não tem suas contrapartidas cumpridas, na próxima investida ele desanima. Os clubes também são responsáveis por não entregar tudo o que foi acertado.

Há de se pensar: será que eu entreguei tudo? Eu fiz um pouco a mais? Combinei de entregar 10 ingressos de um jogo em que a marca do patrocinador estará exposta… posso mandar 20? Será que presentei o empresário com a camisa do time patrocinado pela marca dele? Assistir ao jogo e fui gentil? NÃO! A grande maioria não. Não dão importância. O jogador também não liga, ele acha que o salário cai do céu. Marca um gol e comemora tirando a camisa.

Muitos diretores atribuem um valor irreal aos seus clubes. Por ele não ser um profissional e ser torcedor, muitas vezes ele acha que o clube dele vale muito mais do que deveria. Até mesmo nos grandes. Time grande mesmo é difícil, ele sempre acha que os valores são muito superiores. Às vezes ele acha que vale ficar sem placa de publicidade porque quer um valor maior. Oras, quando alguém interessado liga ou se manifesta, eu tenho que parar o marketing e o comercial do clube e ver que tem alguém interessado. Hoje temos a Caixa, mas a maioria de clubes estavam sem patrocínio. Ou era patrocínio de banco, ou patrocínio local, até mesmo com diretores de empresas que torcem para os clubes, como é o caso da MRV com o Atlético (e que posteriormente investiu em outros clubes). Não temos mais Xerox, Siemens no mercado. O empresariado vê dessa maneira. Hoje temos Vilma, Banrisul… muitos patrocinadores locais.

Quando vejo dificuldade das marcas em trabalhar, porque nos clubes vemos muitos “sobrinhos”, indicados, pessoas sem preparo, mas que tiveram QI. Falta preparo, estudar, entender técnicas, fazer boa proposta. Tive uma experiência muito boa com o Grêmio Prudente/Barueri. Ele foi jogar a copa do Brasil com o Atlético, e por incrível que pareça foi o clube mais profissional que trabalhei. Tudo profissional. Cumpriram com contrapartidas, foram gentis e éticos. Foi emocionante. Nasceu como clube empresa, então a visão é diferente. Outros clubes estão acostumados com verbas de prefeitura, banco estatal… então não procuram se profissionalizar nem o seu departamento comercial. Sinto muita falta disso. Tem clube grande que quando você pede a proposta de negócios, ele quer saber quem é! Tem muitos interesses envolvidos também, que você pode bater de frente com pessoas do clube. Quando o clube é administrado por um presidente-torcedor ele não administra como faz com sua empresa. Nada de austeridade. Tudo vai na emoção. Até porque ele ainda tem que agradar conselheiros.

5 – Hoje, muitos estudantes/simpatizantes querem entrar no mercado de marketing esportivo. Qual sugestão e recomendação você daria a eles?

Para você entrar no mercado dependendo da área que você for entrar são necessários alguns cuidados. No comercial você tem que ter o dom de vendedor.  Se você é mais voltado para operação, você é mais operacional: vender as camisas, negociar com empresas de marketing esportivo, trabalhar ativações. Eu trabalhava no comercial, mas as vezes operava também. Acompanhava diretamente no lugar do jogo, eu fazia questão de acompanhar. Pode também operacionalizar um sócio torcedor. Você tem que entender a sua capacidade para se preparar no que pode trabalhar.

Não adianta entender sobre futebol, você tem que entender o que está no entorno do futebol. As pessoas acham que por que você ama futebol você tem que entrar no marketing esportivo. É fundamental que esse profissional não seja torcedor. Na hora de desenvolver sua função, ele tem que pensar como um torcedor gostaria de receber. Se ele for torcedor ele vai pegar pela emoção. Ele tem que ser extremamente profissional. Não é porque você gosta de futebol que você vai trabalhar em um clube. O profissional tem que se capacitar, entender de marketing, tem que estudar. E você vai ver qual a sua habilidade: comercial, operacional, marketing ou se vai realizar funções que entende, cuidar de logística, almoxarifado, estratégia.

Prestar atenção em quem está anunciando, na audiência do jogo, nos detalhes do evento. Estudar como funciona franquias e licenciamento é uma boa dica. O potencial dos clubes é muito grande nisso. O Flamengo tem um potencial enorme, deveria estar faturando mais do que tem faturado. Mas se você entrar com outra visão, você pode fazer a diferença, hoje tem clubes fazendo a diferença com profissionais capacitados. Leia livros, sites, cases, acompanhe e fique atualizado com o que está acontecendo.

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